Cidades Integrativas
Bem-vindos a uma nova forma de olhar as nossas cidades, e a pensar maneiras de torná-las melhores para as pessoas e o planeta: as cidades integrativas.
Nova, na verdade, é a terminologia. Essa forma de olhar e pensar começou a florescer em Curitiba no início da década de 1970, quando o arquiteto e urbanista Jaime Lerner assumiu pela primeira vez a prefeitura do município e, junto com uma equipe de talentosos profissionais, começou a transformar a cidade em um laboratório de experiências urbanas de vanguarda que, com o passar dos anos, se consolidaram como boas práticas e mostraram um caminho possível para alcançarmos cidades mais humanas, sustentáveis, solidárias e prósperas.
Não se trata de se arrogar perfeita, de criar mais um rótulo, ou de se pretender disseminar uma “receita” aplicável a outros tempos e contextos. Cidades são criações humanas e, como tal, refletem nossas singularidades, talentos, idiossincrasias, qualidades e defeitos em constante mutação. Se trata, justamente, de aprofundar o entendimento de como trabalhar cada realidade com as lentes que nos inspiram e, a partir daí, buscar soluções integradas que se reflitam em melhor qualidade de vida.
Elaborar conceitos é tarefa epistemológica de grande complexidade, mas, traduzir conhecimentos difusos em algo que possa ser compreendido, compartilhado, aperfeiçoado e reinventado é tarefa necessária para que ideias possam ganhar concretude e relevância. É esse objetivo que nos move neste exercício intelectual, ainda em construção, e cujo amadurecimento e desdobramentos compartilharemos aqui regularmente.
Há mais de duas décadas Lerner já havia conceituado uma ideia cujo vocabulário parte da medicina, as Acupunturas Urbanas: intervenções rápidas e precisas no território que ajudam a criar sinergias que revigoram não só o local da aplicação, mas o organismo como um todo. E é na medicina que se buscou novamente a inspiração para o conceito das cidades integrativas.


Em linhas muito breves, a medicina integrativa tem por premissa focar na saúde e na prevenção, não na doença; e no paciente em sua totalidade, não como um somatório de partes. A saúde não é apenas um fato biológico, mas uma condição ampliada para aspectos emocionais, sociais, mentais e espirituais. Em algumas linhas terapêuticas é, inclusive, um fenômeno interpessoal e transgeracional. Eventuais tratamentos são individualizados, e as responsabilidades por seu sucesso são partilhadas entre a equipe terapêutica e o paciente, que passa a ser agente da melhora em sua qualidade de vida.
A experiência de Curitiba tem alguns tripés trabalhados de forma interconectada: uso do solo, transporte público e sistema viário; sustentabilidade econômica, ambiental e social; promoção da identidade, diversidade e coexistência, para elencar alguns. A tartaruguinha Vita, personagem do livro O Vizinho, parente por parte de rua escrito pelo Jaime, é nossa “mascote” simbólica, ilustrando a metáfora da integratividade. Esse “bicho da melhor qualidade”, como posto em sua apresentação, personifica a essência de um viver integrativo orgânico no morar, trabalhar, recrear e deslocar, as funções urbanas clássicas da Carta de Atenas.
Fotografia: Daniel Katz.
O Jaime sempre colocava que “cidade não é problema, é solução.” Mas essa cidade não é “qualquer” cidade. Novas situações por vezes requerem novas palavras, e propomos que a cidade aqui defendida é uma Cidade Integrativa: aquela com foco na qualidade de vida, no desenvolvimento integral que compreende as dimensões não só territoriais, mas também sociais, econômicas, emocionais, culturais; aquela que não prescinde da participação ativa dos cidadãos e da integridade, competência e dignidade dos processos políticos e de gestão pública; aquela que reconhece os limites da nossa autossuficiência perante as forças da natureza e a necessidade de se respeitarem as condicionantes por ela delimitadas.
No exercício dessa construção prático-conceitual, já há alguns materiais publicados que vem agregando a sua expressão, os quais deixamos aqui, com o convite de que participem conosco dessa forma de entender, planejar e agir na cidade!




